Madonna transforma playbacks, danças e imagens em arte (quase) perfeita
Por Regis Tadeu, colunista do Yahoo! BrasilUma das coisas mais interessantes da minha profissão é que, com o passar do tempo, surge uma incontrolável necessidade de abandonar a visão restrita de um determinado assunto e passar a enxergar as coisas de uma maneira mais ampla, profunda e racional, principalmente em um mundo que rapidamente está se tornando não menos que aterrorizante.
A cada dia que passa, mais e mais pessoas se entregam ao nefasto e persuasivo ato de esquecerem de si próprias, como se a alienação fosse uma "virtude" - para não dizer "necessidade" - social. Para muitos, é mais fácil e seguro ser uma besta alegre e sorridente.
Isso me veio à cabeça no momento em que eu saí do estádio do Morumbi, na última quinta-feira, após assistir ao espetáculo que Madonna acabava de apresentar. Escrevo "espetáculo" porque o que ela faz não é um show, e sim uma espécie de evento multimídia, em que músicas, coreografias e imagens são jogadas em um único caldeirão. O grande lance é que cada um desses elementos recebe um tratamento impecável, embora frio, com muito pouco espaço para o inesperado.
A abertura desta "celebração", a cargo do (ótimo) produtor Paul Oakenfold bancando o DJ, foi uma vergonha, já que o cara fez uma discotecagem totalmente 'pizza de mussarela', com um repertório pra lá de óbvio - Rihanna, Red Hot Chili Peppers, White Stripes -, coisa que até mesmo um escoteiro adolescente seria capaz de fazer. Seria um mau presságio do que viria a seguir?
Não. Ao iniciar sua apresentação com duas canções de sua lavra recente - "Candy Shop" e "Beat Goes on", do disco Hard Candy -, Madonna demonstrou que sabe muito bem que cada passo que dá é recebido com adoração e, o pior, com uma adulação que beira a idiotia. Por isso, se deu ao luxo de esbanjar movimentação freneticamente aeróbica durante duas horas e pouco, ao longo de mais de vinte canções.
A parafernália tecnológica era embasbacante. Inúmeros cenários virtuais, exibidos em telões de inacreditável definição, ofereceram um painel visual esplendoroso que, por vezes, se sobressaiu em relação ao som apresentado, até mesmo quando as imagens de Britney Spears e Justin Timberlake surgiram como coadjuvantes na tela - a primeira em uma espécie de duo em "Human Nature" e "Vogue"; enquanto o segundo foi exibido para uma parceria em "4 Minutes". Alguns arranjos soaram bem interessantes, como a remixada junção de "Into the Groove" dentro da base de "Jump".
Surpreendentemente, a banda que a acompanhou se mostrou medíocre. Na hora em que teve que mostra serviço genuíno, tocando de verdade, sem apoio das inúmeras programações eletrônicas, samples e outras traquitanas, seu desempenho foi patético. Na versão rocker de "Borderline", o que se ouviu foi uma execução totalmente desprovida do peso intencionalmente programado. O mesmo resultado aconteceu nas pífias "Miles Away", "Hung Up" e "Music", agravado pelo fato de Madonna ter desafinado horrores - as canções que citei neste parágrafo foram algumas das poucas em que ela realmente botou o gogó para funcionar. Apesar disso, como suas duas backing vocals têm o mesmíssimo timbre de voz de Madonna, isso ajudou um bocado na hora de disfarçar os playbacks.
Mas mesmo com toda essa exuberância, houve alguns momentos constrangedores e desnecessários, como o ringue de boxe em que dois bailarinos fingiram lutar enquanto Madonna trocava de figurino; o cafoníssimo bloco "hispânico cabalístico", enxertado no meio do show de maneira desconjuntada, totalmente desnecessário, evidenciando ainda mais as características raquíticas de "La Isla Bonita", que nem mesmo o pequeno grupo musical cigano que a acompanha conseguiu salvar. Mas o mais inacreditável foi o momento em que Madonna "pediu" para alguém do público, "aleatoriamente" escolher uma música ao acaso, para que ela pudesse cantar "de improviso" (os parênteses aqui servem para reforçar a ironia de minhas palavras). Como em todos os shows da turnê as pessoas pediram "Like a Virgin", está quase na cara que se tratou de uma armação da produção, que aparentemente instruiu previamente o fulano "escolhido" na primeira fila para pedir a mesma música.
Madonna está muito à frente de seus pares, não apenas no aspecto musical - sua decisão em se associar com produtores talentosos sempre dá um upgrade em seu repertório -, mas principalmente na arte de embalar sua arte. Como se soubesse que não é capaz de oferecer espontaneidade genuína para um mundo real, ela trata de construir seu próprio mundo para que as pessoas entrem nele como sedentos voyeurs. E nisso ela é insuperável.
4 comentários:
não parece que você odeia tanto a Madonna pra perder tanto tempo da sua vida fazendo esse blog falando mal da dela...
só não vou te chingar aqui porque tenho educação e não tenho costume de usar palavras baixas como você tem!
ahahaha desde quando fanzeco tem educação?
Valeu pela visitinha, espero que tenha ficado bem putinho.
meu comentário será simples, o cara foi na veia da questão.
"Como se soubesse que não é capaz de oferecer espontaneidade genuína para um mundo real, ela trata de construir seu próprio mundo para que as pessoas entrem nele como sedentos voyeurs."
sem os produtores manonna nunca teria existido.
Esse cara tem umas críticas boas, mesmo...
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